Conservação do solo e sua importância para a biodiversidade e mitigação das mudanças climáticas
Por Ciça Wey de Brito
Neste ano de 2020 faleceu uma das mais importantes pesquisadoras e difusoras da conservação dos solos no Brasil a Dra. Ana Primavesi, que completaria 100 anos em outubro.
Ana Primavesi
Ana Primavesi , nascida na Áustria, veio para o Brasil em 1948 e atuou aqui como engenheira agrônoma e professora da Universidade Federal de Santa Maria, onde criou o primeiro curso de pós-graduação focado em agricultura orgânica. À pesquisadora é também reconhecida a influência para o estabelecimento da agricultura orgânica e a agroecologia.
A conservação dos solos no mundo e no Brasil não têm sido tarefa fácil! Este imprescindível elemento da natureza, que dá suporte a todas as nossas atividades é o resultado de um longo trabalho da natureza. Para dar uma ideia de como é lenta a formação do solo é só pensar que são necessários cerca de 400 anos para se formar 1 cm (um centímetro) de solo!
Para que o solo seja criado é necessária a ação da chuva, do vento, do calor, do frio e de organismos (fungos, bactérias, minhocas, formigas e cupins), que ao desgastarem as rochas de forma lenta no relevo da terra, criam partículas (minerais e orgânicas) que vão sendo depositadas em camadas, chamadas de horizontes.
Estima-se que no mundo cerca de 25% de todas as espécies vivas residam no solo. Em apenas um metro quadrado de solo são encontrados bilhões de organismos e milhões de espécies. Muitas destas espécies não são facilmente visíveis por nós, humanos. Parte delas é de fungos e bactérias, responsáveis por decompor a matéria orgânica do solo, controlar a dinâmica do carbono orgânico e tornam os nutrientes disponíveis para as plantas. Esta grande variedade de espécies é ameaçada pela intensificação de uso do solo e pelo intensivo de fertilizantes químicos, pesticidas e herbicidas.
Outro grande problema mundial é a perda de solos por erosão. Em 2019 a ONU alertou para o número superlativo de perda de solos por erosão no mundo – 24 bilhões de toneladas de terra fértil. Além da erosão “roubar” terras cultiváveis, o solo carreado pelas chuvas se deposita nos córregos e rios, deixando-os assoreados e poluídos. A perda de solos pela erosão tem também efeitos econômicos diretos como mostrou estudo da FAO (Food and Agriculture Organization) de 2016. O estudo estimou que perdas anuais de culturas causadas por erosão foram de 0,3% da produção. A erosão em solo agrícola e de pastagem intensiva varia entre cem a mil vezes a taxa de erosão natural e o custo anual do uso de adubos para substituir os nutrientes perdidos pela erosão chega a US $ 150 bilhões, segundo a organização.
No Brasil, mesmo a experiência e dedicação da Dra. Primavesi e de outros técnicos e cientistas, que como ela olharam o solo como um ambiente vivo e sensível e pregaram a sua conservação, não foi suficiente para evitar a degradação desse importante ativo ambiental. No país, temos 60 milhões de hectares de pastagens degradadas!.
A conservação do solo é um conjunto de princípios e técnicas agrícolas que visa o manejo correto das terras cultiváveis, procura manter a estrutura e fertilidade dos solos e evitar sua erosão. Algumas destas práticas são:
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- Adubação orgânica
- Adubação Verde
- Plantio Direto
- Agroecologia
- Rotação de culturas
- Sistema de Integração Lavoura Pecuária e Floresta (ILPF)
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O solo é um ativo ambiental essencial à vida na Terra e sua conservação deve merecer toda a atenção. Ele garante a produção de alimentos, fibra e energia, fornece serviços ambientais essenciais (regulação e abastecimento de água, do clima, conservação da biodiversidade, sequestro de carbono e serviços culturais).
Como vem alertando o secretário-geral da ONU, António Guterres, recuperar solo de terras degradadas, é também uma arma importante na luta contra a crise climática, uma vez que o setor de uso da terra representa quase 25% do total de emissões globais, e que a restauração de terras degradadas tem o potencial de armazenar até 3 milhões de toneladas de carbono anualmente.
O Brasil possui reconhecida capacidade técnica de trabalho com seus solos, boa parte focada na melhoraria de fertilidade de alguns deles, notadamente os que suportam o bioma Cerrado, onde boa parte da agropecuária nacional está estabelecida.
É portanto de se esperar que num país tão dependente da produção agropecuária, esta mesma capacidade de inovação e grandes investimentos possa ser redirecionada, para recuperar a qualidade/capacidade de solos perdida em muitas regiões do país, para intensificar o uso de técnicas de conservação do solos já há muito conhecidas e para apoiar uma mudança necessária do paradigma de uso descuidado deste insubstituível ativo ambiental.
Que os ensinamentos de Ana Primavesi vivam se espalhem para sempre!